quarta-feira, 18 de abril de 2012

"Poetry" (Shi, 2010)



Poesia? O que és? Rimas que nos fazem sorrir? Versos soltos, nexo, só para o autor? Palavras colocadas juntas para formar orações que soem bem ao ouvido? Que significas tu? Onde te encontro?

Crianças brincam junto ao rio. Um dos meninos, acerca-se da margem. Vê algo a boiar. É um corpo. Uma adolescente. Pós criança, pré-adulta. Pouco mais velha que ele. Não voltará a ir para a escola, nem brincar, como ele o faz.
Mija (Jeong-hie Yun) é uma sexagenária, que vive da pensão e do trabalho em part-time, no qual, toma conta de um idoso atingido por uma trombose. Veste-se de muitas cores, padrões de flores e um velho chapéu de palha são a sua preferência. Toma conta de um neto que mal dá pela sua existência, depois de abandonado pela mãe, que prefere viver em Seul, longe do filho fruto de uma relação falhada. Ela passa por meia tola. Ninguém a ouve realmente, mas não parece dar-se conta disso. E esquece-se muito. Palavras mundanas passam-lhe ao lado com frequência. As memórias mais antigas parecem mais frescas. O médico apresenta um veredicto desanimador. Mija tem a doença de Alzheimer. A memória irá degenerar progressivamente. Escapa-se-lhe o tempo. Por entre o quotidiano do passar a ferro, cozinhar, lavar a loiça, ir às compras e ninguém com quem conversar, Mija toma a decisão de, antes que o tempo fuja de vez, aprender poesia. Ela sempre quis aprender poesia e se calhar até tinha jeito, como uma vez lhe disseram. O professor da aula onde se inscreve faz parecer que qualquer um pode escrever poesia. Tudo o que tem de fazer é deixar de olhar e começar a ver. Onde vai Mija encontrar na sua vida banal poesia? Poderá mesmo existir poesia numa maçã? Entretanto, a rapariga é enterrada. Mija deu pela sua morte e até a comentou. Uma colegial da escola do seu neto atirou-se da ponte. Jong-wook (Da-wit Lee), afirma que mal conhecia a rapariga e continua a ouvir música, ver televisão, a deixar tudo desarrumado e a sair com o grupo de amigos como dantes. Um dia, entre sessões de poesia, um dos pais dos amigos de Jong-wook, aborda-a e pede-lhe para a acompanhar. Mija dá por ela numa reunião de pais, onde lhe é contado que Jong-wook e os amigos abusaram repetidamente da rapariga durante meses antes desta se matar. Eles estão a combinar o modo de oferecer uma compensação monetária à mãe da rapariga, na qual, Mija deverá contribuir, para abafar o caso e os miúdos não serem presos. Surreal. Mija parece ouvir mas não compreender. Com certeza, o neto não fez aquilo. E no entanto, diariamente, Jong-wook parece tão indiferente como dantes. Outra questão a consome. Onde encontrar a poesia. Poderá Mija encontrar na vida a sua poesia? Ou é na morte de Agnes que Mija irá encontrar uma verdadeira ligação à vida e encontrar pois, os versos que lhe escapam?
“Poetry” é a balada daqueles que não são, não conseguem ser ouvidos. E dos tubarões, dos indiferentes que o fazem. É sobre aprender o significado da vida. Não somos insignificantes. Certamente que Mija não é. Uma velhota que se cobre de vestidos florais, uma alegria que não tem. Uma mulher que se sacrifica para dar aos outros o pouco que tem. E para quê? É insignificante. Ninguém quer saber dela. Ela serve apenas para servir. Nunca fez nada de verdadeiramente importante na vida nem irá fazer. É insignificante, para eles. E Agnes? Ela é um botão a quem a oportunidade de desabrochar foi roubada. A mãe solteira, estoirada e com um filho mais novo por cuidar, dificilmente conseguirá dar voz, à vida que foi ceifada. O máximo que pode fazer é compor um altar à menina preciosa que não conseguiu proteger. Mija, aprende, com a banal aula de poesia e as sessões de leitura que começa a frequentar, a expandir os seus horizontes e pela primeira vez na vida, vê! É um processo de aprendizagem na segunda metade da vida, o abandonar o de uma vida de cegueira decadente para um “carpe diem”, se pretenderem, consciente. A dor é um processo consciente mas um que deve ser percorrido para se fazer o que é mais correcto. Que pode uma mulher de meia-idade fazer contra a injustiça, mesmo que esta advenha daqueles que mais ama? Se o desejar? Tudo.
“Poetry” talvez seja considerado longo em duração, demasiado filosófico até e o facto de ter uma mulher de meia-idade no papel principal, pode não soar à primeira vista interessante mas há muita “poesia” por descobrir neste filme. Mais que não seja vale a comovente, “Canção de Agnes”, onde ouvimos pela primeira vez, a voz da menina que a não tem mais. Cinco Estrelas.

Realização: Chang-dong Lee
Argumento: Chang-dong Lee
Jeong-hie Yun como Mija
Da-wit Lee como Jongwook
Hira Kim como Senhor Kang
Nae-sang Ahn como pai de Kibum
Myeong-shin Park como mãe de “Agnes” Hee-jin

Próximo Filme: "Let the Right One In" (Lat den rätte komma in, 2008)

Sem comentários:

Enviar um comentário

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...