quinta-feira, 18 de outubro de 2012

"Seediq Bale: Warriors of the Rainbow" (Sàidékè balái, 2011)




Parece que deste pequeno país à China, com uma passagem pelos EUA, no topo da lista de erradicação de povos indígenas (culpem a televisão), a estória das tribos nativas é marcada por guerra, sangue e morte. “Coexistência pacífica” é uma expressão maravilhosa mas despojada de sentido no mundo real. Quando esta coexistência apelidada de pacífica apenas é alcançada à custa da conquista e humilhação, como se pode, legitimamente, esperar por mais que uma paz podre e uma subserviência que sobrevive alimentada por uma memória que aguarda por uma centelha inflamatória? O modo de vida dos seediq, população aborígene de Taiwan é um de caça, bebida e de guerrear entre si. Originalmente eram cortadores de cabeças e os seus únicos rivais eram eles próprios, recorrendo a pequenas ofensas para satisfazer o capricho de divertimento. O papel da mulher é relegado para segundo plano. O próprio título do filme conta essa mesma história, seediq bale significa algo como homem verdadeiro.  A mulher está lá para o bom e o mau feitio do seu homem de coração quente seediq. A mulher assegura o calor no lar e a amamentação dos filhos. E pouco mais saberemos dela. A personalidade do homem seediq é tão intempestiva e inesperada quanto a natureza.
Enquanto o homem seediq pulula por entre o terreno selvagem e inexplorado de uma ilha muito distante da cidade de edifícios que rasgam o céu, pouco adiante, o povo japonês, civilizado e calculista prepara uma nova demonstração de força. A ilha não é tão importante quanto demonstrar o poderio do império do sol nascente contra toda e qualquer oposição real ou imaginada. Entre a ilha e o povo japonês está Mouna Rudao (Lin Ching-Tai) o irascível líder de uma facção da tribo seediq, o povo aborígene da ilha de Taiwan. Após a invasão que esmaga quaisquer pretensões de domínio sobre as facções rivais, Rudao aprende a refrear o ego, o seu e o dos outros, temendo que qualquer movimento em falso possa acordar a besta nipónica. Ele vive entre o mundo dos vivos e o dos deuses e ele canta os seus divinos senhores como se vivesse naquele mesmo plano. Superior. Além da ponte do arco-íris, onde os pastos são verdes e existe caça para todos. Mas os deuses estão insatisfeitos. Eles clamam pelas glórias do passado, em que os seediq caçavam e esmagavam os oponentes e com as suas cabeças reclamavam qualquer esperança destes transitarem para o outro lado. O povo japonês esmagou a arrogância dos seediq, retirou-lhes as terras e humilha-os constantemente. Sobreviver a troco da dor do conhecimento da superioridade do inimigo? Sobreviver para não lutar por uma última vez? Sobreviver para as gerações vindouras nunca conhecerem o gosto pela caça, nem provarem a sua masculinidade através da morte? Ou estão destinados a sobreviver como uns bêbados, comprados com o vinho do invasor? Não. Os deuses clamam pelo sangue do inimigo e a época em que os Seediq se unem como um só e lutam até ao último homem… E é Mona Rudao, o homem que irá unir, contra o ego e as escaramuças passadas unir o povo dividido. Pela liberdade.
Em “Seediq Bale: Warriors of the Rainbow” existe o mesmo gosto amargo de “Braveheart”, “Apocalypto” e “O Último dos Moicanos”. A sensação de fatalismo, sem entrarmos por considerações históricas está demasiado presente. Não é latente. É manifesta. Umas centenas de homens armados com flechas nada podem contra milhares de militares, os mesmos que viriam a atacar Pearl Harbour e a atrair a ira americana. No entanto, a piedade, por todo o sofrimento que o povo seediq atravessa só é superada pela barbárie que este povo provoca em igual proporção contra o povo japonês. O incidente Wushe de 1930, que provoca a revolta contra o povo japonês, colonos e militares demonstra que numa guerra não há bons nem maus, apenas dor e morte.

As tentativas (pois que são muitas em quatro horas de duração), de se tentar demonstrar o povo seediq como corajoso e valente saem, de certo modo goradas no comportamento bestial e errático do mesmo e na chacina evitável de mulheres e crianças de ambos os lados. Nenhuma canção deste mundo consegue apagar da memória o derrame do sangue dos inocentes. E por tudo quanto resultou tal incidente e a temível, brutal e esperada reacção japonesa que diminuiu grandemente a população seediq, não deixa de ser irónico que no século XXI, sob o jugo chinês, numa “Taiwan civilizada” os aborígenes sejam ainda em menor número. Três estrelas e meia.

Realização: Te-Sheng Wei
Argumento: Te-Sheng Wei
Lin Cing-Tai como Mona Rudao
Masanobu Andô como Genji Kojima
Umin Boya como Temu Walis

Próximo Filme: "Sex is Zero 2" (Saek-jeuk-shi-gong-ssi-zeun-too,  2007)

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