domingo, 12 de janeiro de 2014

"Marianne", 2011


Adoro tropeçar em filmes sem um grande estúdio por trás, feitos com pouco mais que boa vontade e que parece que estão no radar de pouca gente. Têm umas críticas assim-assim e são oriundas de um destino menos habitual para o fã incondicional de terror. Por isso, quando encontrei “Marianne” senti-me como uma miúda pequena a quem acabaram de oferecer a primeira Barbie.
Krister (Thomas Hendegran) não tem sido um bom homem. No funeral da mulher Eva (Tintin Anderzon), que morreu em consequência de um acidente de carro que ele conduzia, apercebe-se que Sandra (Sandra Larsson), a filha mais velha, o odeia e prefere a companhia de Stiff (Dylan M. Johansson), o namorado oito anos mais velho. Não é de admirar pois, dez anos antes, ela e a mãe, descobriram que Krister mantinha uma relação extra-conjugal chegando mesmo a abandonar a família pela amante. Os próximos tempos não se adivinham fáceis pois, Krister tem a recém-nascida Linnea, fruto de um novo recomeço de vida ao lado de Eva, o enorme sentimento de culpa associado às acções que levaram à morte da mulher e uma filha adolescente revoltada. Some-se a isso, uma sogra disposta a dar apenas o apoio estritamente necessário (afinal, Krister traia frequentemente Eva) e a “imposição” da escola onde ensina, de que consulte um conselheiro (Peter Stormare) e, aguardam-no muitas noites de insónias. Krister é um céptico, um homem prático, mas até ele não pode deixar de tremer, quando se sente visitado, todas as noites por uma presença sobrenatural. São de culpa as dores que sente ou por trás estará algo bem mais sinistro.

“Marianne” tem por base o folclore sueco, que conta a lenda da “Mare”, ou Pesadelo (em inglês, nightmare), um ser que visita o Homem durante a noite e se senta sobre o seu peito, inspirando-lhe maus sonhos. A sugestão advém de uma fonte improvável, embora, na verdade, a maioria dos personagens seja improvável para a ficção. Krister encontra-se bastante distante de um herói. É um homem frio, hedonista e mulherengo, um egoísta, que até ali conduzia um estilo de vida totalmente conduzido por si, sem interferências externas. Nem a degradação psicológica o faz largar o vício do álcool. A não ser que seja esta que o mantenha distante dos muitos esqueletos que esconde... Sandra é uma adolescente com uma vida interior muito mais velha do que os seus 18 anos anunciam. A necessidade de amadurecer motivada pelo abandono do pai e a necessidade de conforto da mãe fizeram-na temer tanto a vida familiar que agora rejeita o pai e a irmã mais nova. De certo modo é tão casmurra e tão céptica quanto o pai. Já o namorado Stiff, aos 26 anos não perdeu a criança que existe dentro dele, deixando espaço para a brincadeira e para o mito, vivendo como se fosse ainda um jovem sem responsabilidades. É ele a voz conciliadora entre ela e o pai, uma voz da razão estranha, para tão desconfortável situação.
“Marianne” pouco tem de terror, as visitas nocturnas a Krister são breves e raramente deixam antever alguma imagem mais brutal. Quando isso sucede, o orçamento limitado torna-se bastante óbvio mas é compensado pela vasta caracterização das personagens. As conversas desconfortáveis entre pai e filha, ou entre este e o conselheiro sobre o impacto da morte de Eva nas suas vidas, demonstram o à-vontade e naturalidade de Filip Tegstedt no retrato da vida familiar. Sem artifícios, pois os diálogos parecem conversas de pessoas que tão podiam ter-nos a nós como inspiração como o nosso vizinho do lado e não um “diálogo ficcional criado para o ecrã”. Krister tenta aproximar-se da filha, que resiste aos avanços reconciliatórios do pai e ainda o provoca mais. Por sua vez, a difícil relação entre pai e filha provocam uma ruptura entre o jovem casal de namorados, sendo que Stiff alimenta as ideias de um Krister crescentemente paranóico com o que lhe está a acontecer. À medida que as visitas se tornam cada vez mais frequentes e Krister se apercebe que o resta da família se encontra em perigo aumenta a sensação de opressão. E que pode ele fazer se ninguém se predispõe a acreditar nele, como pressupõem até que o seu comportamento peculiar resulta da degradação do seu estado mental? Em “Marianne”, não existe conforto, apenas a dura realidade da perda e dos que continuam na terra, tentando prosseguir com uma vida cada vez mais vazia. Três estrelas e meia.

 Realização: Filip Tegstedt
Argumento: Filip Tegstedt
Thomas Hendegran  como Krister
Sandra Larsson como Sandra
Dylan M. Johansson como Stiff
Tintin Anderson como Eva
Gudrun Mickelsson como Birgitta
Peter Stormare como Sven


Próximo Filme: "Rouroni Kenshin" (Rurôni Kenshin: Meiji kenkaku roman tan, 2012)

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